domingo, 14 de outubro de 2007

Vidro no ventilador

I

São quase duas da manhã, procura uma cabeça rosa por entre as pretas. Não sobrou nenhum fósforo para riscar. Segue com o cigarro dependurado no canto da boca protelando a primeira tragada de tanta preguiça para procurar um isqueiro, outra caixa de fósforos e desandou este texto.

Existe alguma coisa estranha no ar, talvez a falta de comunicação ou a comunicação castrada que nós temos, incompleta. Me pergunto: que comunicação é completa? Clausura do pensamento na palavra.

E quando sexo já não basta tanto? E quando queria conversar sobre as coisas da vida numa profundidade em que você se afogaria? E que me irrita você não crescer apesar de te gostar assim tão menino.
Ela tinha que pintar a cabeça de vermelho: corrigir as provas. Dormiu o dia inteiro. E de repente essa mania de se afastar das pessoas das quais sente saudade.

Odeio segundas-feiras. Está tudo com gosto de cinza. Está tudo "demorando em ser tão ruim".

Preciso corrigir as provas, estudar, pintar os cabelos, fazer as unhas, ler quem eu gosto e beber chopp preto. E a vida é isso aí? Coca-cola é isso aí.

Ontem você águou duas vezes, assim como quem tem fome. Te deixei salivando até que me abocanhasse. Te amo, ele me disse. Te amo.

Disse que eu discuto colocando o dedo na cara. E que essa mania, eu peguei de um tal fulano que eu namorei. Ele disse: você é orgulhosinha.

E você é egoísta. Eu disse. Ele está pesado e eu ficando velha.

Rio, 30 de Setembro de 2007.

24 comentários:

Anônimo disse...

ler algo que parece tão biográfico é constrangedor?

Mas seu narrador já tá mais complexo, variando a perspectiva e talz.

Tive de rir com o "orgulhosinha".

Mas se coca-cola é isso aí, que não seja zero, ao menos. porque vou te dizer...

E pode confessar que seu desejo é se tornar uma velhinha borgeana. A gente pode bolar um apelido pra vc, tipo "vieja madre".

=]

Anônimo disse...

Te enviei email.

O Nome da Rosa disse...

"ler algo que parece tão biográfico é constrangedor?"

Te imaginei ruborizando ao ler o texto. haha

Madre ainda não sou e nem vieja. Mas se curso da vida seguir serei madre e serei vieja. Borges morreu viejo, mas não foi padre.

Esse texto era do outro blog, foge um pouco da proposta desse aqui. Só queria atualizar o blog.

As diferentes perspectivas deve ser influência do Faulkner. [Eu disse] rs

O Nome da Rosa disse...

devem*

O Nome da Rosa disse...

Acabei de ler seu email. Parece uma caricatura do meu. rs

Anônimo disse...

O apelido pode ser outro, foi o primeiro que me veio.

É, o seu texto me deu vontade de escrever algo. (Acho ótimo quando isso acontece)

Imagina o que pode acontecer se vc ler Proust ahaha

Nem sabia que tu mantinha o outro ativo.

=]

O Nome da Rosa disse...

Só achei que vc me fez caricata e teve uma visão rasa deste texto. Talvez porque seja auto-biográfico, talvez porque fuja dos moldes das histórias de amor argentinas. Essas histórias que vc lê, mas não vive. Talvez daí o seu constangimento. ;]

Talvez falte tempo para incorpar a massa. Amo Borges, mas minha vida está muito longe daquela vidinha monástica. haha Graças a Deus. =)

Anônimo disse...

então, maturidade é a clareza da incompletude. é preciso disposição para ser feliz. ficar bem por um tempo às vezes basta. outras vezes não. acho que você já aprendeu isso. eu tô tentando, teorizando ao menos. como bem diz meu velho amigo songs, "não sou borgeano, prefiro as ruas, as musas, prefiro-as nuas". (invertendo o gênero, os versos me cabem). gostei muito do seu texto. você constrói imagens lindas, embora cruéis (o que tem um grande valor literário: palavras escritas com o corpo). quando eu crescer quero ser assim, como tu! bjs.

ps: vê como o tempo pode ser irônico! ao invés de enclausurar pode fazer a gente se apressar em viver!

Anônimo disse...

vem cá, vocês dois, tem nada melhor pra ser na vida que argentino não? que merda, hein?!

O Nome da Rosa disse...

hauhauahuahauahuahuaha

Chileno, pode?

Ps. Eu tb quero ser tu quando crescer Doutora Annilda!!!

BeIjO.

Anônimo disse...

doutora em sambisse, como diria mário de andrade (olha o que eu tô citando!). "batuque é um privilégio/ ninguém aprende samba no colégio..." um dia eu ainda vou entender direito de qualquer coisa que seja, enquanto isso, vamo dando pitaco!

Anônimo disse...

ahaahahaahaha

poxa, mas eu nem achei que ficou bom, érica; foi apenas exercício. concordo que ficou muito superficial.

Eu nem quero ser argentino, ô. Quero ser nada.

Ah, eu nem vou comentar isso de que só leio em vez de viver porque seria um comentário interminável.

Quero ser doutor tb qdo crescer!!

Anônimo disse...

Cinco dedos no ventilador
(Leonardo Martinelli, vulgo léo baba)

Para esta beleza
que gira
metendo a mão no ventilador

Indicador

aquela quase coisa
mastigando-se num vácuo giratório
de brisa e plástico -
embalagens perfeitas para idéias fixas
prestes a vedar-se -
delicada armadilha em suas mãos
(dois pára-raios varados pelo mesmo raio)

Médio

Perdido o cuidado
de si durante o
toque, ao menos
olhos astutos
pudessem reavê-lo -
porém estão
cerrados pela dor,
não mais captam
sinal de abalo
sob a lona fina

de unha e medo,
sequer a espiral
de gotas atônitas
vazando desde a ponta dos dedos

Anular

Mão e hélice contracenam
como os cones de uma
ampulheta partida ao meio
(areia derramada aos pés
do tempo, entre cacos
de espera e desespero)

Mínimo

o sangue pulsa
nas pás da máquina?
a pele gira
ao sabor do corte?
o ar revolve
a carne do instante?

Polegar Opositor

ou talvez no fundo
ele quisesse apenas
retomar seu sono
barrando o influxo
de ar frio sobre os
pés descobertos -
talvez nem isso

O Nome da Rosa disse...

Vc ter citado o Léo aqui, me lembrou uma vez em que estávamos Nêga, Bruno, eu e ele no Seu Fernando e de repente ele vira e fala: "Nunca mais aponto o dedo pra ninguém que eu tenha namorado."

E a gente sem entender pn perguntou o por quê.

Ele repondeu: "Porque quando eu aponto um dedo pra vc três se voltam para mim."

Anônimo disse...

Ééééérica,

por acaso vc tem o livro "Outras Inquisições" do viejo?

=]

Cantemos samba ou tango uruguaio?

O Nome da Rosa disse...

Tenho, te empresto. Existe tango uruguaio?

Anônimo disse...

\o/

o tango nasceu no uruguai e se popularizou na argentina.

percebe como a passagem precisa ser trocada?

=]

Anônimo disse...

deixo aqui um linqui de utilidade pública, pois o mundo precisa saber que Gardel era uruguaio:

http://www.montevideo-tango.com/mvdt/Gardel.htm

fica também a sugestão, com cara de desafio, da escritura de um texto tangüístico.

\o/

O Nome da Rosa disse...

Um texto "tanguístico" pra um leitor de cortázar dever ser molezinha. rs [Vai que é Tuyo]

Quero ver escrever um texto tanguístico uruguaio. Será um texto devagar quase parando. Só lembro do Felisberto Hernadez olhando para o teto durantes duas páginas de um conto! O tempo no Uruguai parece congelado.

Muito comédia essa história do Gardel ser uruguaio...huahauhuah
Pra mim é tudo igual Erico Veríssimo, Benedetti, Borges Guiraldes, desde o RS até o pantanal matogrossense. Todo mundo criado na base do chimarrão.

Anônimo disse...

eu vi um filme uruguaio não faz muito tempo: "wisky". gostei! devagar quase parando, mas bom!

agora, engraçada essa necessidade que muita gente da música tem de demarcar território, registrar paternidade (o lugar, mais que a autoria). em literatura isso parece já não ser tão importante (não sei, não entendo nada de literatura, mas me parece assim).

li o livro de um sujeito que diz que o samba é indígena, fulniô e pernambucano (é claro, como podia deixar de ser!? mais pernóstico que pernambucano, só argentino. e paulista, claro. não o seu, érica, que na verdade é pernambucano). mas o sujeito sofre da compulsão por origem que ataca a maioria dos pesquisadores de música popular.

bom, carioca ou pernambucano, ninguém questiona a brasilidade do samba, afinal de contas a brahma quer vender cerveja do aiapoque ao chuí, então, valha-me são zeca pagodinho!

he,he, foi mal aí galera, é a doença da tese...

Anônimo disse...

ps: nelson cavaquinho é quase tango: "quando eu passo perto das flores/ quase elas dizem assim:/ vai, que amanhã enfeitremos o seu fim..." lindo, não?! como sofria, o poobre!

Anônimo disse...

oiapoque! tô com sono...

Anônimo disse...

passei no sebo mais cedo e comprei um livro do onetti, he,he,he. só não sei quando vou ter tempo de ler... deu saudades da ariadne!

Anônimo disse...

adorei a fotografia do flog!